terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Fuga

Era uma noite quente, mas havia uma brisa agradavelmente fresca acariciando seu rosto, ainda estava completamente apaixonado não havia dúvida. Caminhavam grudados ele a carregava carinhosamente no colo em direção ao carro como se fossem recém casados.
A olhava nos olhos e talvez ela tenha suspirado. Ele achou meigo, apesar dela parecer mais exausta do que apaixonada.

Ele foi dirigindo como de costume. Passaram na porta do bar onde deram o primeiro beijo, pela orla da praia onde caminharam de mão dadas por diversas vezes. Viram a fila na porta da boate favorita dela. Era uma última volta, antes de pegaram a estrada para longe da cidade que abandonavam.

Apesar de toda a tranquilidade era uma noite triste, uma noite de despedidas. A viagem que se iniciou antes mesmo de entrarem no carro era sem volta. Ele a olhou sentada ao seu lado, a cabeça recostada no banco, a franja lhe cobrindo os olhos. Ela pareceu adotar aquele ar de indiferença fria que normalmente o irritaria, mas não naquela noite. Não na ultima noite que passariam juntos. As luzes da cidade se fundiam na janela atrás dela, criando um balé luminoso no seu rosto apático. Era uma visão linda. Ele lamentou ter que deixa-la, sofria por saber que depois daquela noite não a veria mais. Não havia jeito, ele sabia.

Pararam no mercado, ela manteve o mesmo semblante neutro e ficou no carro aguardando por ele.
Trouxe para ela um vinho argentino, o preferido dela, não achou as castanhas de caju, mas comprou chocolates e uma bala de leite que ela apreciava muito. Comprou também um cartão e flores.
Pegou para si mesmo um sanduíche e pensou em oferecer um pedaço a ela, mas achou melhor deixa-la em paz.

Seguiram viagem, ele olhou para trás vendo as sacolas no banco traseiro, havia biscoitos, cerveja, papel higiênico, querosene, lâmpadas, rúcula, alguns temperos, miojo, queijos, água, velas, fósforos, uma lanterna, xampu e sabonetes, cobertores, toalhas, um monte de coisas úteis e outras completamente inúteis.

Mas acabou esquecendo justamente da maldita pá.

4 comentários:

  1. Fugir tem dessas coisas. Não se consegue pensar em fazer lista de necessidades, né? Já esqueci uma lâmpada e repelente.
    Abraços e um 2010 hiper prá ti

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  2. só a pá?
    então foi obrigado a mudar de idéia...

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  3. Como disse minha sózia Lilly Allen:

    "And you killed it, you killed it
    You killed it with 'I love you' "

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  4. Ele vai ter que voltar ou achar uma outra forma de prosseguir. E não é isso que acontece tantas vezes? Há quem sempre volte atrás (com pleonasmo e tudo), há quem sempre siga em frente, há quem oscile entre um e outro. E ele? O que fará?

    Engraçado que às vezes fico curiosa em relação ao destino de meus próprios personagens, mas nem sempre eles podem ser escritos. Escrever, "literariamente" falando, não é só questão de opção. Ao menos, no meu caso.

    Bjs.

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